The Dasgputa Review

O tesouro do Reino Unido solicitou ao Sir Partha Dasgupta, eminente economista ambiental da Cambridge University, a preparação de um relatório sobre o estado da arte da Economia da Biodiversidade.

O relatório intitulado “The Dasgupta Review – Independent Review on the Economics of Biodiversity” foi publicado em abril 2020, em plena crise da covid-19. Como não é possível ignorar a pandemia, o relatório menciona algumas das implicações para a relação homem-natureza.

O relatório foi escrito em linguagem bastante acessível para leigos, sem os hamiltonianos que Sir Partha insiste quando trata de bens comuns manejados ao longo prazo, mas sabemos que atrás dos verbos há equações. Neste sentido, não sentimos falta de um discurso sobre a importância da taxa de desconto, notoriamente ausente (que alívio!) no Relatório.

É interessante que Sir Dasgputa começa o relatório reconhecendo a contribuição das mudanças no uso do solo para a liberação de zoonoses, como a covid-19. Não reconhece o vírus como componente da biodiversidade a ser conservada!

O Relatório trata da necessidade de oferecer “a unified framework for thinking about the economics in a way that fully accounts for Nature and the risks that emerge from loss of Nature“. Evidentemente Sir Dasgputa quer propor seu próprio “framework”, para não pegar emprestado algo do TEEB (The Economics of Ecosystems and Biodiversity) ou do IPBES (The Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services), ou mesmo de Robert Costanza, mas se refere à relação entre capital natural e material e os fluxos que fazem parte de qualquer avaliação deste teor hoje em dia, conceitos que surgiram no bojo da Economia Ecológica.

O capítulo 2 do relatório trata a natureza como um objeto de oferta e demanda, levando a um déficit devido à atividade humana em overshoot. Embora concorde, consistente com Nicholas Georgescu-Roegen e os expoentes de Economia Ecológica, que a economia está inserida e dependente da Natureza, trata o problema como um equacionamento buscando equilíbrio, necessitando ajustes de comportamento humano como planejamento familiar e redução de consumo, receitas malthusianas.  Explicitamente reconhece o papel das empresas implicadas nas perdas assim como nos investimentos necessários para recuperá-las.

No entanto, o mero fato que adota como ponto de partida a rejeição da externalidade da Natureza com respeito à economia e a existência de limites representa um avanço: “acknowledge that the human economy is embedded within – not external to – Nature, which helps us to recognise the limits Nature places on the economy and, in so doing, reshape our understanding of sustainable economic growth“. O ‘crescimento sustentável’ nesta frase de efeito é um non sequitur que não cabe bem de lado do princípio que a economia está embebida na Natureza, muito pelo contrário: o crescimento mesmo esverdeado dificilmente se sustenta. 

Há um anexo em que há uma formalização do conceito de sustentabilidade de uso da natureza que ele chama de ‘Impact Inequality’, que relaciona estoques naturais (oferta) e sua produtividade (NPP) com o PIB (demanda), e procura estabelecer o ponto em que se alcança um nível insustentável fundamentada numa pegada global dentro de limites planetários. Logo, há que manter o nível de pressão humana abaixo deste nível. O que surpreende aqui é que o eminente economista ambiental adota como ponto de partida que ‘the global economy is bounded by the biosphere as a constraining factor, a fact absent from standard models of economic growth and development‘. The times they are a changin’, como disse Bob Dylan. 

Quanto aos resultados, só vamos saber mais para o final do ano. A equipe do Relatório está fazendo uma busca de evidências e alguma forma para estimar este ‘déficit de oferta de natureza’, mas já deixaram de partida que não vão fazer uma estimativa do valor global das perdas da biodiversidade, então se é isso que está sendo esperado, não vai acontecer.

Como o relatório está sendo realizado a pedido do Tesouro do Reino Unido, deve ser algo que ajude o governo britânico a pensar em como investir em capital natural para o futuro deste país (por exemplo, com o Brexit, sem poder recorrer a Comunidade Europeu, e nem aos EUA certamente pelo menos até 2021, pois o Trump está alinhado ao Bolsonaro neste quesito). O que se pode esperar do Reino Unido no Brexit nesta linha é uma incógnita total, mas com certeza bem mais limitado do que esteve no passado, dentro dos limites da ilha britânica.

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